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CRÍTICA: BRANCA DE NEVE: Entre o conto de fadas e a crise no cinema atual.

  • Foto do escritor: João Paulo
    João Paulo
  • 27 de mar.
  • 4 min de leitura

Muito pode ser dito, está sendo dito e será dito sobre a nova versão de Branca de Neve da Disney. Inevitavelmente, é uma obra que já nasce com a necessidade de se justificar, de provar seu valor, afinal, não pode ser apenas uma cópia do seu antecessor. Porém, carrega também a responsabilidade de levar essa história tão conhecida a novas gerações. E existe ainda a questão da durabilidade dessa obra. Qual será sua longevidade? O que ela quer dizer e pelo que quer ser lembrada?


De forma prática e crua, é apenas mais um filme que escancara uma crise que não acabará tão cedo. Diante disso tudo, o que devemos fazer, enquanto espectadores, enquanto pessoas críticas e amantes do cinema?


O filme é repleto de problemas: problemas com a linguagem audiovisual, com o corpo que compõe sons e imagens, com as músicas que constroem tanto os pontos altos quanto os baixos, com a performance de Gal Gadot, e o maior de todos — a Disney e o que ela representa em 2025. Vivemos uma crise no cinema, um momento em que, desesperadamente, buscamos algo do passado que já funcionou, tentando trazê-lo para o presente, apostando no que é seguro, no que é garantido, no que vai gerar retorno financeiro. Para os grandes estúdios, arriscar não é uma opção. E esse cenário não vai mudar tão cedo. Pelo contrário. A tendência é piorar — e está piorando. Basta olhar os anúncios dos próximos lançamentos da Disney e de outros grandes estúdios. Branca de Neve não é o primeiro, e certamente não será o último.



Foi pensando nisso que, ao tentar escrever este texto, quis fugir um pouco do que já está sendo falado. Porque essa realidade — pelo menos por agora — é inescapável. Então me perguntei: como podemos responder a isso? Como extrair algo de bom desse cenário? Seja para transformá-lo, seja para fazer dele, no mínimo, um momento... suportável. Ou até bonito, quem sabe? Não bonito pelo que ele é, mas pelo que ele desperta em nós. Afinal, o que são filmes senão a nossa interação com eles? E o que somos senão seres humanos desesperados por sentido, significado, propósito?


Como sempre digo, a qualidade que mais admiro nesses remakes, reboots e sequências é quando eles não tentam ser o que suas histórias já foram. Amo quando ousam trazer algo novo, uma ideia diferente, um contraponto ao que já existiu. Porque isso mantém a roda girando. E Branca de Neve, nessa nova roupagem, embora sem muito sucesso, ainda arranha essa tentativa. Dá para traçar um paralelo bonito com o que essa versão propõe — e que a anterior não trazia: a ideia do compartilhar, da proximidade, de ver o outro e ser visto, de lembrar do outro e ser lembrado. Não basta se apegar à nostalgia de um tempo em que a floresta crescia e se multiplicava; é preciso agir. Fazer algo. Sair da inércia.



Levando tudo isso em conta, e aceitando que essa realidade não vai mudar do dia para a noite, acredito que precisamos aprender a extrair algo sem nos deixarmos paralisar. Sem olhar para essas obras como nada, sem desprezá-las. Afinal, apesar dos muitos pesares, ainda são obras. E uma vez lançadas ao mundo, deixam de ser do artista, da Disney, e passam a ser nossas — do público. De todas as formas, a arte, a reflexão e o amadurecimento devem ser incentivados. Dessa maneira, naturalmente, a arte evoluirá junto conosco.


Enquanto isso, sim, devemos manter um olhar crítico, mobilizador, até revoltado. Mas, apesar disso tudo, quando fui assistir Branca de Neve no cinema com dois amigos queridos, tive uma tarde maravilhosa. Eu ri, me diverti, fiquei constrangido, me apaixonei, me arrepiei, fiquei bravo, senti vergonha... mas o mais importante: eu senti. E que bom que senti. Estar ali, naquele momento, dentro do cinema, com aquelas pessoas, assistindo a um filme, foi suficiente. E às vezes, tudo se resume a isso.


A maioria de nós concorda que Branca de Neve é um erro. Sua construção foi conturbada, cheia de controvérsias, e mesmo após o lançamento, continua gerando manchetes na imprensa. Mesmo com todo esse contexto, ainda foi possível apreciar alguns momentos do filme. Os números musicais Wanting on a Wish, Whistle While You Work e A Hand Meets A Hand são os pontos altos do filme. Foram os poucos momentos em que me senti criança novamente. Rachel Zegler é incrível e entrega presença, carisma e autenticidade. Ela é a grande potência e carrega o filme o máximo que pode. Por outro lado, não pude conter o constrangimento na maior parte de Branca de Neve, o que inclui a péssima atuação de Gal Gadot como a Rainha Má e a representação dos sete anões, o que levou alguns bons minutos até me habituar à estranheza.


Contudo, no geral, minha experiência assistindo Branca de Neve me lembrou que não podemos e não precisamos ser tão duros o tempo todo. A realidade já é dura demais. Se formos duros até com a arte, qual é o sentido de tudo isso? Qual o propósito da arte sem propósito? E qual o nosso propósito diante de uma arte sem propósito? Devemos sim ser duros com a arte, mas de uma maneira que a impulsione para algo melhor, que nos impulsione a sermos melhores. Por mais contraditório que seja, o cuidado e a sabedoria estão em reconhecer essas nuances.


Imagino se eu tivesse escolhido focar apenas nas partes negativas: no peso que esse remake carrega, no que ele representa dentro da máquina que é a Disney e em todo esse discurso vazio que só funciona dentro da sala de cinema e desmorona do lado de fora. Sim, tudo isso é real. Mas e se, pelo menos por um instante, naquela sala escura, nos permitíssemos vivenciar o momento? Mesmo que o filme seja, subjetivamente, "ruim"?


Talvez o valor esteja aí: no simples fato de estar com pessoas queridas, de se deixar tocar, de estar presente. De interagir com a obra. A maior lição que esse filme (e esse momento do cinema) pode nos dar, talvez seja essa. Por fim, ainda que eu já tenha sido, seja ou venha a ser incoerente, no fim das contas, esse texto é somente o relato da experiência de alguém que compartilhou do prazer de estar dentro do cinema com amigos.



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